O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) prepara a edição de um decreto que proibirá o pagamento de emendas parlamentares a ONGs e Organizações Sociais (OSs) que não fazem a prestação de contas dessas despesas de forma transparente na internet.
Uma minuta da nova norma foi elaborada pela Secretaria de Governo e Relações Institucionais, chefiada por Gilberto Kassab (PSD), e tramita entre as secretarias envolvidas com repasses das emendas em São Paulo. A publicação se dará após o aval das demais pastas, mas ainda sem prazo.
A proposta é que as exigências feitas sobre o assunto no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre tema sejam replicadas no estado.
Em agosto passado, tratando das emendas federais, o Supremo determinou que ONGs e demais entidades do terceiro setor divulgassem na internet os valores recebidos de emendas de qualquer natureza e como esses recursos foram gastos. Em dezembro, 13 entidades chegaram a ter seus repasses suspensos por descumprimento da decisão —após correções, houve liberação.
Embora a determinação do Supremo não se aplique às entidades na esfera estadual, a secretaria resolveu se antecipar para seguir as regras.
A medida do governo paulista ocorre após reportagem da Folha mostrar, na última semana, que as entidades privadas que mais receberam verba indicada por deputados estaduais em 2024 não seguem o padrão das regras determinadas pelo STF.
O texto do decreto exigirá que as entidades publiquem em seu sites os valores recebidos em emendas nos dois anos anteriores e como esse recurso foi aplicado. A medida vale para as emendas impositivas, de pagamento obrigatório pelo governo, e para as voluntárias, que costumam privilegiar deputados aliados.
Sem isso, as ONGs e OSs já não poderão receber emendas ainda em 2025.
“Está em estudo no governo um decreto para estabelecer que as entidades do terceiro setor beneficiadas por essas emendas e indicações [emendas voluntárias] detalhem em seus sites o uso dessas verbas. As entidades deverão demonstrar como foram aplicados os valores já recebidos e deverão demonstrar como serão usadas as verbas indicadas, condição indispensável para futuras liberações de valores”, afirma Kassab.
Hoje, as entidades beneficiadas com emendas têm a obrigação de prestar contas ao governo, que são analisadas pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado). A falta de transparência na divulgação das despesas à sociedade não é um fator levado em conta para barrar o acesso aos recursos.
Após a publicação da reportagem, porém, a secretaria de Kassab entendeu que é preciso exigir mais transparência das ONGs e OSs. A pasta já havia adotado, em 2023, na atual gestão, medidas para ampliar a publicação da distribuição das emendas no portal do governo paulista.
Segundo Kassab, o objetivo do novo decreto é fazer com que a sociedade também possa averiguar a aplicação dos recursos, para além da fiscalizações do governo e do TCE. Ele afirma ainda que a gestão tem compromisso com a transparência e, por isso, lançou o site que detalha o pagamento das emendas.
A reportagem mostrou que mais de mil organizações receberam verbas (empenhadas ou já pagas) em 2024 por meio de emendas impositivas, ou seja, que são escolhidas por deputados e depois avaliadas e obrigatoriamente repassadas pelo estado.
Elas somam R$ 318 milhões, segundo dados da Secretaria Estadual de Governo. O valor representa 38% do total das emendas impositivas, que são destinadas também a prefeituras e órgãos estaduais.
O levantamento feito pela Folha entre as 20 instituições mais beneficiadas, que concentraram 22% dos repasses, aponta que elas não seguem os parâmetros de Dino. Praticamente todas as entidades possuem uma página de transparência, mas apenas 3 dessas 20 indicaram o total de recursos que receberam de emendas no ano passado e como os gastaram.
A procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo Élida Graziane, entende que a decisão de Dino vale também para as emendas estaduais, obedecendo à simetria federativa.
O Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, de 2014, também já prevê que entidades do terceiro setor precisam divulgar os projetos e valores oriundos de recursos públicos.
Em 2024, Tarcísio mais que dobrou a distribuição de emendas voluntárias, superando valores pagos pela gestão tucana anterior e passando a contemplar deputados federais e senadores no ano eleitoral, quando o fluxo de recursos para as prefeituras é considerado crucial nas disputas locais.
Esse recurso é usado para bancar gastos, obras e melhorias em municípios e entidades indicadas pelos deputados, sendo uma forma de favorecer a base eleitoral de aliados.