De forma previsível, Jair Bolsonaro (PL) foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República sob a acusação de comandar a trama golpista para ficar no cargo no ocaso de seu mandato, como apontado pela Polícia Federal
A formulação de que em países sérios tal cenário poderia decretar o fim da carreira perdeu o sentido na era Donald Trump, isso para não falar no longo histórico de reviravoltas da política brasileira.
Assim, tão telegrafada quanto a denúncia de Paulo Gonet, e sua mui provável aceitação, é a tática Trump adotada pelo seu seguidor. Como o americano, eivado por uma condenação criminal mas eleito para um novo e já turbulento mandato em 2024, Bolsonaro aposta que pode voltar ao Planalto.
Primeiro, propagandeou uma reversão de sua declaração de inelegibilidade no próprio Tribunal Superior Eleitoral. Alertado sobre a chance nula de isso ocorrer, fia-se em projeto de anistia.
Elas giram em torno do 8 de janeiro, e Bolsonaro quer se ver incluído no eventual perdão aos invasores das sedes dos três Poderes em 2023.
Trump passou sua campanha eleitoral dizendo se vítima de caça às bruxas, mas o fato é que nos EUA ele poderia governar teoricamente de dentro de uma prisão. Aqui, não.
Como dizem ministros do Supremo, a chance de uma anistia ser considerada constitucional, dado o envolvimento direto da corte na condenação dos outros réus do golpismo, é hoje inexistente.
Bolsonaro então poderá repetir o presidente Lula (PT), que quando estava preso em 2018 lançou sua candidatura sabendo não ter chances de vê-la prosperar. Colocou na vice um herdeiro presumido, o hoje ministro Fernando Haddad (Fazenda), para lançá-lo quando o inevitável judicial se impôs.
Haddad perdeu para Bolsonaro, mas hoje nem o nome para um repeteco da operação é consenso nas hostes do ex-presidente. Pior para a direita brasileira, que vive imersa no dilema de deixar o ex-presidente no passado sem alienar seu ainda considerável eleitorado, noves fora namorar a pecha de traidora.
A reação do nome mais vistoso do grupo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), ante as reportagens relatando que seus aliados já foram informados de sua disposição de concorrer, se Bolsonaro lhe ungir, é clássica: indignação e negativas peremptórias para a plateia.
Enquanto Bolsonaro se agarra à sua tática, amarra Tarcísio, o não tão próximo Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), Romeu Zema (Novo-MG) e outros num momento em que Lula está com a pior avaliação de seus três mandatos, segundo o Datafolha.
Os petistas têm razão quando lembram que hoje Lula segue favorito, mas desconsideram a distância do pleito e o passivo de impopularidade que o presidente está acumulando. No bolsonarismo, há a crença de que qualquer nome por ele apoiado será competitivo na última hora, como Tarcísio foi em 2022 em São Paulo.
Sorriem assim, por ora, os radicais livres à direita, como o balão de ensaio Gusttavo Lima e mesmo Pablo Marçal, que provou na prática na disputa paulistana de 2024 o poder que o vácuo dá.