O mau momento do presidente Lula, aferido por pesquisas de opinião, tem animado a direita, seja a moderada ou a populista radical. Em alguns círculos, já se elucubra sobre a suposta evidência de que a esquerda não teria mesmo mais discurso e projeto para a sociedade brasileira contemporânea. Esta, finalmente, teria em seus segmentos populares se rendido ao culto da prosperidade e ao empreendedorismo —alguém falou autoengano?—, num sinal de aprovação de concepções liberais.
Compreende-se a aflição dos antipetistas, uma vez que, no primeiro quarto deste século, o Partido dos Trabalhadores venceu cinco das seis disputas presidenciais. Nesse período, a direita dita civilizada surfou na derrubada de Dilma Rousseff e no governo protogolpista de Temer, o mais impopular da história; a seguir, com o fiasco das terceiras vias, associou-se à aventura bolsonarista, que prometia com o pinochetista neoliberal Paulo Guedes uma espécie de nova revolução americana nos trópicos; por fim, restou a abstenção ou engolir a contragosto a “frente ampla” lulista.
Lula e o PT têm cometido erros em série neste terceiro mandato, mas também acertos. Tenho minhas reservas sobre a análise de que a queda da popularidade do presidente seria estrutural.
Há, sim, uma fadiga com a longevidade do líder petista, com seus arroubos verborrágicos e sua personalidade autocentrada. Talvez o país —isso é só uma impressão— preferisse algo diferente.
Ocorre que há uma chance plausível de o mal-estar ser, ao menos em parte, dissipado, e a perspectiva de um novo mandato da esquerda se ampliar.
Seria preciso considerar pelo menos dois fatores. O primeiro é o que parece ser a causa primordial do mau humor —a inflação de alimentos. Não há quem resista à disparada de preços na mesa da classe média, pobres e remediados.
Existe, contudo, uma expectativa de diminuição da conta nos próximos meses, três, quatro, seis, quem sabe. Ao mesmo tempo, não podem ser desconsiderados, mesmo que desvanecidos pelos sustos nas gôndolas, o aumento de emprego e renda e o significativo crescimento do PIB em 2023 e 2024, contrariando as bolas de cristal de “especialistas”.
O outro fator a levar em conta é a ausência de lideranças claras e fortes na direita. Bolsonaro pode ser considerado candidato fora do baralho —e a fantasia da anistia não ajuda muito. Sua criatura mais vistosa é o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. É o atual “darling” da direita e do mercado, cujas incansáveis bandeiras são ajuste fiscal com cortes de gastos sociais e privatizações encabeçadas pela Petrobras —ideias por si pouco atraentes para o grande eleitorado. Tarcísio, todavia, com apoio de seu demiurgo, teria atrativos a acrescentar para rebanhos mais amplos.
Só que não se sabe se está disposto a contrariar Bolsonaro e se correria o risco de sair do cargo em abril de 2026, abandonar uma reeleição estadual garantida e enfrentar o grande animal político-eleitoral do Brasil, mesmo que ferido, com a máquina governamental na mão. A resposta parece ser não.
Escrevi aqui, em maio do ano passado, que o projeto de Lula para 2026 estava subindo no telhado. De fato, mas ainda pode descer e voltar à rampa do Planalto. O jogo está longe de ser definido.
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