O ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) José Celso de Mello Filho foi leitor, colaborador e muitas vezes fonte de notícias do jornal Integração, de Tatuí (SP), sua terra natal.
O ministro acompanhou a trajetória do jornal desde seu primeiro número até a última edição, no dia 24 de dezembro de 2024, diz o jornalista José Reiner Fernandes, editor do semanário.
O jornal nasceu em 24 de dezembro de 1975 na Cásper Líbero, onde Reiner se formou. “Celso era promotor de Justiça e meu amigo. Como ele se insurgiu contra a ditadura militar, prestava serviço de assessor jurídico do secretário José Mindlin, na Secretaria da Cultura do Estado de Paulo”, relembra Reiner.
No último editorial, Reiner afirmou que “o jornal nunca se acovardou na defesa dos interesses da comunidade. Muitas vezes, enfrentando demandas judiciais, sempre vitoriosas, para que prevalecessem a liberdade de imprensa e a credibilidade das informações publicadas”.
Celso de Mello confirmou à revista Consultor Jurídico que Reiner sofreu processos cíveis e criminais em razão do seu ofício: “Nunca cedeu! Ganhou todos esses processos!”
Em 2019, quando estava em julgamento a prisão em segunda instância, Celso de Mello foi alvo de ataques pela internet. Uma mensagem chegou a sugerir que o ministro não aparecesse mais na cidade.
O jornal Integração registrou que “em Tatuí existe uma ‘‘milícia digital’’, aliada ao mais odioso pensamento de extrema-direita”.
Reiner atribuiu a iniciativa a grupos bolsonaristas que pretendiam “proclamar” uma “condenação prematura” do ministro ao “exílio”.
No mensalão, quando se sentiu pressionado antes de votar a favor dos embargos infringentes, Celso de Mello enviou seu desabafo para Reiner, que estava na Suíça:
“Nunca presenciei um comportamento tão ostensivo dos meios de comunicação sociais buscando, na verdade, pressionar e virtualmente subjugar a consciência de um juiz.”
Quando Sergio Moro foi indicado ministro da Justiça de Bolsonaro, o ex-juiz confirmou o fato em mensagem para o WhatsApp de Celso de Mello. O diálogo só foi publicado no Integração.
Quando o Senado confirmou o nome de Celso de Mello para compor o STF, em 18 de junho de 1989, a manchete do jornal de Reiner foi: “Bravo, Celsinho!”
Dias antes de aposentadoria de Celso de Mello, reportagem da Folha revelou como o ministro manteve Tatuí como referência. Na cidade natal, ele não era apenas um membro do STF. Era o “ministro tatuiano”.
“O Celso sentiu mais que eu o fechamento do jornal”, diz Reiner. “Sua paixão sempre foi o jornalismo e a liberdade de imprensa”.
“Foi uma decisão minha tomada de livre e espontânea vontade”, afirma Reiner. Em outubro de 2023, ele sofreu uma retinopatia e perdeu a visão do olho direito.
“Como estou com 73 anos e não tenho sucessor, a partir daí iniciei meu processo de fechar o jornal”. Ele tem três filhos, bem-sucedidos em suas carreiras (Medicina, Economia e Administração). Reiner teve o apoio da família.
“Eu fui amadurecendo a ideia de parar com o jornal impresso. Sempre cuidei com zelo a parte administrativa e não tenho problemas em encerrar a pequena empresa”, diz.
Reiner fechou o jornal em janeiro, porque em 31 de dezembro venceram todas as assinaturas de 2024. Ele diz que não vai cobrar pela circulação de mais um mês.
“Todos os contratos de publicidade foram rigorosamente cumpridos. O jornal não possui nenhum passivo trabalhista, todos os encargos sociais estão pagos. Como disse meu contador: ‘É só dar baixa na Junta Comercial e encerrar a empresa’.”
“O jornal Integração sempre foi a minha vida. Eu estou em plena paz, com a sensação do dever cumprido. Nunca me acovardei diante de ações judiciais que tentaram calar o jornal”, diz Reiner.
Celso de Mello define Reiner como “um notável paradigma de profissional da imprensa”.
O ex-decano escreveu: “Tatuí e a região perdem uma voz importante. A imprensa paulista perde um grande jornal do interior”.
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