O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) não reluta em chamar sua secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Natália Resende, de “supersecretária”. Na última vez que fez isso, durante um anúncio de medidas para o meio ambiente no Palácio dos Bandeirantes, no fim de janeiro, aproveitou para elogiá-la por concluir o doutorado, arrancando aplausos da plateia.
A predileção explícita por Natália entre os secretários alimenta especulações, para aliados de Tarcísio, de que, caso dependesse só dele, sua sucessão ficaria com ela —seja como sua vice na tentativa à reeleição, seja em seu lugar no governo caso ele concorra à Presidência em 2026.
A equipe de comunicação da secretária nega veementemente qualquer iniciativa que a coloque como eventual candidata, e ela se recusou a dar entrevista à Folha sobre o tema.
Natália Resende, 37, nasceu em Uberaba (MG), mas se mudou para Formosa (GO) quando tinha cinco anos. A cidade, a 80 km de Brasília, com economia baseada na agropecuária, era a terra de seus avós maternos.
Em 1992, sua mãe, Mônica, usou o dinheiro da venda de um carro para montar uma academia esportiva, que batizou de MN (de Mônica e Natália). Ambas ainda são sócias do negócio, que hoje é um centro de “saúde e bem-estar” com natação, pilates e outras modalidades.
Descrita por colegas como séria, competente e viciada em trabalho, a secretária cultiva um perfil técnico e não é filiada a nenhum partido. Em 2005, aos 18 anos, ingressou no curso de engenharia civil na UnB (Universidade de Brasília), primeira de suas três graduações (as outras são em direito e ciências contábeis) e estudou para concursos públicos.
Ela conheceu o governador no anexo 2 do Palácio do Planalto, quando trabalharam no PPI (Programa de Parcerias e Investimentos) do governo Michel Temer (MDB). Na época, Natália era procuradora federal e dava consultoria ao programa, que Tarcísio coordenava.
Quando o colega foi nomeado ministro da Infraestrutura, na gestão Jair Bolsonaro (PL), ela se tornou consultora jurídica de sua equipe e, a partir de 2022, passou a representar o ministério em seminários sobre concessões de infraestrutura.
Ex-diretor da Secretaria Nacional de Aviação Civil, o economista Ronei Glanzmann, CEO da Moveinfra (entidade que reúne concessionárias de serviços públicos), trabalhou com a dupla na época. Ele destaca que ela já despachava com ministros do STF e do STJ. “Natália sempre foi extremamente competente e profunda conhecedora dos bastidores de Brasília.”
O apelido de “supersecretário” costuma ser atribuído em governos ao auxiliar que aglutina várias funções. O hoje ministro do STF Alexandre de Moraes, por exemplo, era chamado de supersecretário de Gilberto Kassab na Prefeitura de São Paulo quando cuidava de transportes e serviços.
Após derrotar Fernando Haddad (PT) para o governo paulista, em 2022, Tarcísio fundiu as pastas de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística sob o comando de Natália, que ganhou essa fama.
“Natália não tem viés político nenhum. Ela porta toda essa credibilidade. Não à toa Tarcísio juntou as pastas e colocou ela à frente”, afirma Glanzmann. A fusão gerou críticas de entidades como a ONG SOS Mata Atlântica, que viam a preservação ambiental em risco com a área sendo gerenciada por uma especialista em concessões.
Com o tempo, Natália atenuou as críticas. Quando fala em público, ela apresenta conceitos técnicos e explica seus significados, misturando as informações com números, e desvia dos temas espinhosos.
Na semana passada, em entrevista à RedeTV!, ela foi confrontada com reduções de verba neste ano para o combate a queimadas florestais. Rebateu com dados de crescimento de outro programa, de proteção da biodiversidade.
“As pessoas olham uma rubrica, que é uma linha só do orçamento”, disse, defendendo que era preciso olhar o “o orçamento todo”. “O programa de proteção ambiental teve um aumento de 2023 para 2024 de 30%”, afirmou.
Quando o tema foi as enchentes na capital, destacou que o Jardim Pantanal, bairro mais afetado, “já está com 95% de água e esgoto”.
Esse estilo foi colocado à prova na privatização da Sabesp, considerada uma vitória de Tarcísio que é compartilhada com a auxiliar. Em maratona, Natália recebeu centenas de prefeitos para discutir a proposta e falou com jornalistas e com representantes da Faria Lima em eventos públicos e privados.
A oposição questiona o fato de as ações terem sido oferecidas por valores baixos (40% menores do que os atuais) e por só uma empresa ter se interessado pelo negócio. Há cinco ações civis do PSOL na Justiça sobre o tema. A reportagem levou os pontos ao governo, que não se manifestou.
No mundo político, por outro lado, Natália enfrenta dificuldades.
Sua pasta é responsável pelo DER (Departamento de Estradas de Rodagem), órgão de interesse para deputados estaduais, pois irriga seus redutos eleitorais com verbas para obras rodoviárias, mas que passa por entraves.
Somente em dezembro passado, o TCE (Tribunal de Contas do Estado) suspendeu três licitações de obras rodoviárias, que representariam investimento de R$ 187 milhões. O órgão apontou falhas básicas nos processos, como composição de tabela de preços. As suspensões são consideradas frequentes e geram atrasos, na visão de aliados.
Um dirigente partidário com anos de articulação política chama Natália de “a favorita” de Tarcísio. Mas avalia que a principal arma do governador para garantir apoio no ano que vem é justamente a oferta da vaga na chapa para o Palácio dos Bandeirantes, seja como cabeça (caso dispute a Presidência) ou vice (se tentar a reeleição). Por isso, descolada da vida partidária, Natália não teria vez.
O secretário Guilherme Derrite (Segurança Pública) negocia uma possível ida para o PP, em um movimento que, para aliados, mira o governo. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, quer o cargo de vice, segundo avaliam integrantes do governo. A saída do vice atual, Felício Ramuth, do mesmo partido, é dada como certa. São cotados ainda nomes do PL, do União Brasil e do MDB, partido do prefeito da capital, Ricardo Nunes.
Por outro lado, outro integrante do governo faz uma analogia futebolística para negar a possibilidade de a favorita ir às urnas: diz que Natália é a zagueira que garantiu uma defesa sólida a Tarcísio, e seria um erro colocá-la para jogar de centroavante.